A crítica
Memorial do Convento apresenta-se desde logo como uma crítica cheia de ironia e sarcasmo à opulência do Rei e de alguns nobres, por oposição à extrema pobreza do povo.
O adultério e a corrupção dos costumes são factores de sátira ao longo da obra. Crítica a mulher porque “ entre duas igrejas, foi encontrar-se com um homem”; crítica “uns tantos maridos cucos” e não perdoa os frades que “içam as mulheres para dentro das celas e com elas se gozam”; não lhe escapam os nobres e o próprio Rei, até porque este considera que as freiras o recebem “nas suas camas”, nomeadamente a madre Paula de Odivelas.
Nas questões religiosas, não só usa a ironia, como também se revela frontal nas apreciações à Inquisição e aos santos que a ela se ligaram como S. Domingos e Santo Inácio, considerados “ibéricos e sombrios, logo demoníacos, se não é isto ofender o demónio”. Esta acusação resulta de toda a imagem histórica dos tempos inquisitoriais e das práticas então havidas. Há uma constante denúncia da Inquisição e dos seus métodos e uma crítica às pessoas que dançam em volta das fogueiras onde se queimaram os condenados.
A sátira estende-se a Mafra e à situação dos trabalhadores; à atitude do rei em obrigar todo o homem válido a trabalhar no convento; aos príncipes, como D. Francisco, que se entretém a “ espingardear” os marinheiros ou quer seduzir a rainha, sua cunhada, e tomar o trono.